segunda-feira, 1 de novembro de 2004

Primeira passeata

Como não há carro, e é feriado decidi fazer pela primeira vez algo de realmente interessante! (É que no meio de tanta restrição, ainda não consegui passear nada, simplesmente porque não há carro nem tenho amigos com carro!) Então ontem abandonei o pessoal daqui sem dizer para onde ia, porque até pensei vir almoçar a casa, ir só dar uma voltinha. Pensei ir até ao rio Cuiva, que não fica nada longe, uns 30 minutos a pé.



Cheguei ao rio e pensei porque raio é que havia de me ficar por ali se ainda era de manhã. Então decidi ir à Camera, uma missão no meio do mato que se vê do Chinjenje, lá no alto, depois de e atravessar o rio. Claro que tinha o problema de ser a subir e de serem uns 8 km até lá, mas porque não? Eu até tinha trazido um pacote de bolachas e ainda dava para ir almoçar a casa! Lá fui andando.

Estranhamente fui encontrando pessoas simpáticas pelo caminho. Não sei se já perceberam que em geral as pessoas aqui não são nada simpáticas e são imensamente desconfiadas. Faço ideia do que pensavam: “o que andará esta cachindeli a fazer aqui?” Lá fui andando até que cheguei à missão 2 horas e meia depois de ter saído de casa. Assim que cheguei, ficou tudo muito surpreendido por lá. Um Sr., que mais tarde se apresentou como Sr. Miguel, dá-me as boas vindas aos terrenos da missão e fica extraordinariamente surpreendido por me ver chegar a pé. Disse para eu visitar à minha vontade.



A missão está destruída, como tudo nesta terra. Mas a igreja ainda se mantém mais ou menos, porque é a única coisa que tem telhado. Fiquei praí 1 hora na torre da igreja, mesmo ao pé dos sinos, de onde se tinha uma vista fantástica. Via-se o Chinjenje, o Ukuma, e vim a saber depois que até se vê a Ganda, mas eu como sou tão pitosga e não levei óculos nem vi. Também estava ligeiramente enevoado, talvez não se visse realmente.


Desci da torre e era para me ir embora. O Sr. Miguel disse que um dia tinha que voltar com mais calma, fazer um piquenique e subir ao alto de um rochedo perto de lá, de onde se teria uma vista ainda mais fantástica. Perguntei-lhe quanto tempo se demorava e se tinha caminho, ele respondeu que se demorava meia hora e que tinha caminho, que não tinha nada que enganar. Decidi ir.

Ele arranjou-me dois miúdos para irem comigo, não fosse eu me perder, e para me levarem a um reservatório de água que havia lá no alto que antigamente servia para armazenar água que depois caía cá em baixo numa turbina para fazer energia 24 horas por dia para o hospital que lá existia. Já estão a imaginar como fiquei encantada ainda antes de ver! Lá fui eu com os miúdos. Foi muito fixe. A vista de lá de cima era muito linda.



Mesmo assim não subi tudo porque os miúdos não sabiam mais o caminho, o que quer dizer que não foi desta que vi, pelo menos de longe o ponto mais alto de Angola, que é praí a uns 30 km daqui em linha recta. Mas de qualquer maneira subi aos 1750 metros desde os 1250 metros do rio Cuiva e desde os 1400 metros da missão, nada mau. O que eu queria mesmo era os 2600 do Morro Moco, mas não quero ir sozinha! Cláudia, vem cá no fim de semana que vem (feirado dia 11, quinta!) e vamos lá! Se já fizemos 40 km num dia (Tchivinguiro diz-te alguma coisa?), podemos perfeitamente fazer uns 30 em dois dias! Claro que o convite é extensível aos restantes elementos do clube de aventura, só que aos outros é um bocado mais difícil virem até cá!



Voltei de lá de cima com os miúdos, deixei-os na missão, prometi voltar ao Sr. Miguel e regressei. Claro que já eram 15:00 e os meus queridos colegas a esta hora já estariam preocupadíssimos. Mas o Sr. Miguel, vendo que chegou uma bicicleta do Chinjenje e que ia regressar, muito previdente, informou o Sr. da bicicleta que tinha visitas na missão. Não era difícil perceber quem eu era, uma vez que não há mais brancos no Chinjenje! E disse-me para eu ir com calma, que nesta altura já todo o Chinjenje sabia onde eu estava.

Eu é que não podia ir com muita calma porque estava mesmo a ver a carga de água que ia apanhar… E apanhei mesmo. Granizo e chuva durante o tempo suficiente para nem as cuecas escaparem (Cláudia, Rita, isto lembra-vos algo?). Chovia tanto que me fez estugar o passo de tal maneira que em vez das 2 horas e meia da ida, fiz o caminho em hora e meia (também era a maior parte do caminho a descer até ao Cuiva!). O pior é que aqui depois da chuva não fica aquele calorzinho do deserto, fica um frio do caraças e com a roupa toda colada não é muito agradável. Estavam praí uns 12 graus ou menos, mas com vento é mesmo desagradável!

Lá cheguei ao Chinjenje. E não é que os meus colegas não sabiam de mim? A sorte é que pensaram que eu tivesse apanhado alguma boleia para o Ukuma e não ficaram muito ralados! De tal maneira que até comeram o meu almoço, o que quer dizer que tive que me contentar com fruta e pão! A seguir fiz a janta, o que foi uma grande alegria porque aqui raramente tive oportunidade de me chegar à cozinha. Era feriado, demos folga à cozinheira. Por mim até podíamos dar todos os dias, detesto a comida dela e estou farta de comer sempre carapau frito com arroz e salada de tomate! E eu que sempre a minha vida toda comi nas cantinas, até na do Técnico, que agora não sei como é mas já foi mmuuiittoo má, chego à conclusão que, tanto no Huambo como no Chinjenje, as nossas cozinheiras são ainda piores! Vou sair daqui com guelras de carapau, na certa! Ai que saudades da comida das Donas Teresas do Lubango!

E pronto, assim acabou o dia de ontem, que foi de certeza o dia mais fixe e de mais passeio que tive desde que cá estou. Quem me dera companhia para fazer isto mais vezes e ainda ter alguém com quem ir a tagarelar pelo caminho… Mas o que vale é que eu também não em atrapalho sozinha. Não fosse o medo de me meter por caminhos desconhecidos por causa das minas, iam ver! Só que aqui não dá para nos perdermos, nem atalhar pelo mato. Até as estradas são perigosas! Eu só fui à missão porque sabia que iam lá carros, se fosse atalho não sei se iria tão alegremente!

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